sexta-feira, 20 de julho de 2012

DEPRESSÃO EM ESTUDANTES DE MEDICINA PREOCUPA: DIZ ESTUDO.


      Trabalho recente publicado no site Medical Services, relata pesquisa feita junto aos alunos dos últimos anos do curso de medicina da Universidade Federal de Sergipe – UFS,  onde foram constatados índices preocupantes de sintomas depressivos de intensidade baixa a moderada.
       O estudo abordou 117 estudantes do internato de medicina da Uni­versidade Federal de Sergipe, após cálculo para amostra finita com uma margem de erro de 5%, chegamos ao tama­nho amostral de 87 alunos, que foram selecionados através de sorteio simples.
      Foram utilizados como mecanismos de avaliação o Inventário de Depressão BECK – IDB que é  um questionário autoaplicável padronizado, descrito por pesqui¬sadores do Center for Cognitive Therapy (CCT) como medida de autoavaliação de depressão amplamente uti¬lizada, tanto em pesquisa como na área clínica. 
     Ao IDB  foi associado um outro questionário desenvolvido pelos pesquisadores, contendo 54 questões fecha­das, pré-codificadas, abordando as características socio­demográficas, o processo ensino-aprendizagem e aspec­tos pessoais.
    Os sintomas depressivos foram classificados quanto à sua intensidade demarcada no questionário Beck em grupos a saber: sintomas depressivos mínimos ou ausentes (grupo I) e sintomas le­ves a moderados (grupo II), sintomas depressivos moderados a graves (grupo III) e sintomas de­pressivos graves (grupo IV). Para a avaliação foram utilizados apenas os resultados dos grupos I e II já que os valores dos grupos III e IV não foram suficientes significativamente para a pesquisa.
    A prevalência de sintomas depressivos na amostra estu­dada (n = 84) foi de 40,5%. Apresentaram sintomas depres­sivos leves a moderados 34,5% (IC 95% 24,5-45,7); sintomas depressivos moderados a graves, 4,8% (IC 95% 1,3-11,7); e sintomas depressivos graves, 1,2% (IC 95% 0,0-6,5%). Não apresentaram sintomas depressivos 59,5% dos estu­dantes (IC 95% 48,3-70,1).
   No presente estudo, a prevalência encontrada de sintomas depressivos entre estudantes de medicina da UFS foi ele­vada, embora discretamente menor que a encontrada na Universidade da Região de Joinville (Univille - SC), uti­lizando os mesmos pontos de corte. Ela foi superior à en­contrada na Universidade Federal de Goiás e à encontrada por alguns pesquisadores na população geral, entre 3% a 11%7,11,12.
   Em um estudo realizado na China, o pesquisador, ao utilizar o IDB em estudantes de medicina de Hong Kong, com os pontos de corte 9/10 e 29/30, encontrou 50% destes alunos com depressão (IDB > 10) e 2% deles severamente deprimidos (IDB > 30)13. Em nosso estudo, utilizando os mesmos pontos de corte, encontramos resultados seme­lhantes, embora com prevalência menor, demonstrando que o problema é relevante.
   Vários estudos apontam para uma maior prevalência de sintomas depressivos nos estudantes de medicina em re­lação à população geral, o que também foi verificado com os resultados do presente estudo, concordando com outros nacionais e internacionais anteriormente citados.
   Não foi encontrada diferença significante entre os se­xos associada aos sintomas depressivos, como também foi demonstrado num estudo longitudinal finlandês, envol­vendo estudantes de medicina acompanhados durante os seis anos de curso15. No entanto, outras pesquisas apontam uma maior prevalência de sintomas depressivos entre es­tudantes de medicina do sexo feminino.
   Tais achados sugerem que, além das dificuldades refe­rentes ao curso de medicina, aquelas decorrentes de carac­terísticas individuais podem propiciar o aparecimento dos sintomas depressivos.
    Pesquisadores relatam que o período de maior sofri­mento psíquico vivenciado pelos estudantes corresponde àquele em que entram em contato com pacientes grave­mente enfermos. Na nossa realidade, este corresponde ao período do internato, etapa final do treinamento médico da graduação, no qual o contato é estrito e exaustivamente intensificado. Momento em que os estudantes se de­param com a incapacidade de dominar o conhecimento médico como outrora o faziam nos ensinos médio e fun­damental, além de constatarem que as notas, muitas vezes, não traduzem aquisição real de conhecimentos, sentindo-­se frustrados.
    A respeito do progressivo comprometimento da saúde mental dos estudantes de medicina ao longo do curso, al­guns pesquisadores mostraram que os iniciantes apresen­tavam prevalência de sintomatologia depressiva e de an­siedade semelhante à da população geral. Porém, à medida que iam progredindo no curso, aumentavam as queixas relacionadas ao mesmo e, por conseguinte, a prevalência de transtornos mentais comuns (depressivos, ansiosos e somatoformes), com incremento consistente dos relatos de estresse e sofrimento psíquico.
    Um estudo com toda população de estudantes de me­dicina da mesma instituição agora pesquisada revelou pre­valência de 42,5% de transtornos mentais comuns (TMC). Após o ajuste do modelo final da regressão logística, ficou evidenciado que os principais fatores associados estavam relacionados ao processo ensino-aprendizagem e aos as­pectos pessoais, os quais também foram implicados neste presente estudo.
    O sofrimento emocional do estudante de medicina não se limita apenas a ele próprio, mas tem impacto emo­cional sobre sua relação com os pacientes. Vários estudos demonstram a influência negativa do sofrimento emo­cional sobre a empatia do estudante de medicina com os pacientes. Um estudo transversal multicêntrico nos Estados Unidos, envolvendo 1.098 estudantes de várias faculdades de medicina, mostrou a relação negativa e positiva, respectivamente, entre sofrimento emocional e bem-estar com a empatia do estudante de medicina e seus pacientes.
Os autores ao final do estudo concluem:
    A alta prevalência de sintomas depressivos entre os estu­dantes do internato de medicina da UFS, associada a fato­res referentes ao processo ensino-aprendizagem e a aspec­tos pessoais, aponta para a necessidade de mudanças na formação médica, incluindo a implementação de medidas preventivas para o futuro médico.
    Assim, acreditamos que a reflexão profunda sobre o modelo de ensino médico adotado e a criação de um ser­viço de apoio psicopedagógico ao estudante de medici­na, a exemplo dos existentes em centros de referência em educação médica do Brasil e de outros países, contribuirá para minorar o sofrimento psíquico dos estudantes, bem como reforçar suas estratégias defensivas adequadas ao enfrentamento dos problemas inerentes à profissão que escolheram.
    A matéria merece nossa observação pela sua importância e relevância, especialmente ao levarmos em conta que esses futuros profissionais ao se inserirem no sistema de saúde, principalmente os que vierem a atuar em hospitais de grande porte ou públicos, sofrerão uma enorme carga emocional decorrentes das circunstâncias de trabalho. Não é incomum o esgotamento físico e emocional de médicos, enfermeiros e outros profissionais envolvidos nos atendimentos em grandes centros e necessário se faz um política de acompanhamento e auxílio a esses profissionais, tanto na formação quanto na vida prática.
Slrm
Fonte:
Keywords: Depressão; transtornos mentais; estudantes de medicina; saúde mental; educação médica.
Sintomas depressivos entre internos de medicina em uma universidade pública brasileira - Revista da Associação Médica Brasileira; [online]. 2012, vol.58, n.1, pp. 53-59.
Autores:
 Edméa Fontes deOliva Costa1, Ygo Santos Santana2, Ana Teresa Rodrigues deAbreu Santos3, Luiz Antonio Nogueira Martins4, Enaldo Vieira deMelo5, Tarcísio Matos deAndrade6
1 Aluna do Curso de Doutorado, Programa de Pós-graduação em Medicina e Saúde, Universidade Federal da Bahia (UFBA); Professora Adjunta de Psiquiatria, Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil
2 Graduado em Medicina, UFS, Aracaju, SE, Brasil
3 Aluna do Curso de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Medicina e Saúde, UFBA; Médica Preceptora do Internato de Pediatria, UFBA, Salvador, BA, Brasil
4 Doutor; Professor Associado, Departamento de Psiquiatria e de Psicologia Médica, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Consultor da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
5 Mestre em Medicina; Professor-assistente, Departamento de Medicina, UFS, Aracaju, SE, Brasil
6 Doutor em Medicina e Saúde; Professor Associado, Faculdade de Medicina, UFBA; Professor de Psicologia Médica, Programa de Pós-graduação em Medicina e Saúde, UFBA, Salvador, BA, Brasil

 

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