quinta-feira, 24 de novembro de 2011

PODE ALGUÉM SER IGNORADO PELA SUA PROFISSÃO?

Essa matéria recebi de um amigo por email, parece ter sido publicada no diário de São Paulo, por Plínio Delphino,mas não sei a data.
O importante nela é que trata-se de uma tese de mestrado da USP,  feita pelo psicólogo  social Fernando Braga da Costa, que durante um mês trabalhou como gari, varrendo as ruas do campus da USP.
O interessante e triste desse trabalho é mostrar o lado sombrio daquelas pessoas que se tornam esquecidas pela sociedade, parecendo não existir como ser humano, desvalorizadas em sua profissão, perdem também o valor como pessoa humana.
O homem é um ser social, mas dentro dessa sociedade organizada, por critérios de valore culturais e econômicos, alguns seres e  profissões são mais valorizados que outros. Assim, aqueles que abraçam profissões de caráter mais braçal, que exige menos capacidade intelectual, acabam de certa forma esquecidos ou desprezados pelos outros membros da sociedade com melhor padrão devida.
Estes indivíduos, seres como todos nós, exercem funções que embora relevantes e necessárias, são desclassificadas no imaginário social, tornando-se assim, indivíduos anônimos,  quase invisíveis publicamente.
São pessoas que estão ao nosso lado diariamente, mas que na maioria das vezes sequer percebemos, sem mesmo dirigir-lhes um olhar ou um bom dia, como se na realidade não existissem, ou fossem meras peças de decoração.
Essa triste realidade constatada no trabalho desse psicólogo leva-nos à reflexão do quanto nos distanciamos daquele sentimento humanitário que integra as pessoas, relegando nossos irmãos de profissões consideradas menos nobres, a uma condição de existência ignorada, como se nem mesmo existisse.
slrm

Veja o trabalho abaixo:
·        Os grifos e sublinhados são de minha autoria
TESE DE MESTRADO NA USP POR UM PSICÓLOGO
'O HOMEM TORNA-SE TUDO OU NADA, CONFORME A EDUCAÇÃO QUE RECEBE'
'FINGI SER GARI POR UM MÊS E VIVI COMO UM SER INVISÍVEL'
Psicólogo varreu as ruas da USP para concluir sua tese de mestrado da
'invisibilidade pública'. Ele comprovou que, em geral, as pessoas
enxergam apenas a função social do outro. Quem não está bem posicionado
sob esse critério, vira mera sombra social.
Plínio Delphino, Diário de São Paulo.                     
 O psicólogo social Fernando Braga da Costa vestiu uniforme e trabalhou um mês como gari, varrendo ruas da Universidade de São Paulo.  Ali,constatou que, ao olhar da maioria, os trabalhadores braçais são 'seres invisíveis, sem nome'.
Em sua tese de mestrado, pela USP, conseguiu comprovar a existência da 'invisibilidade pública', ou seja, uma percepção humana totalmente prejudicada e condicionada à divisão social do trabalho, onde enxerga-se somente a função e não a pessoa. Braga trabalhava apenas meio período como gari, não recebia o salário de R$ 400 como os colegas de vassoura, mas garante que teve a maior lição de sua vida:
'Descobri que um simples bom dia, que nunca recebi como gari, pode significar um sopro de vida, um sinal da própria existência', explica o pesquisador.
O psicólogo sentiu na pele o que é ser tratado como um objeto e não como um ser humano.
'Professores que me abraçavam nos corredores da USP passavam por mim, não me reconheciam por causa do uniforme. Às vezes, esbarravam no meu ombro e, sem ao menos pedir desculpas, seguiam me ignorando, como se tivessem encostado em um poste, ou em um orelhão', diz.
No primeiro dia de trabalho paramos pro café. Eles colocaram uma garrafa térmica sobre uma plataforma de concreto. Só que não tinha caneca. Havia um clima estranho no ar, eu era um sujeito vindo de outra classe, varrendo rua com eles. Os garis mal conversavam comigo, algunsse aproximavam para ensinar o serviço.
Um deles foi até o latão de lixo pegou duas latinhas de refrigerante cortou as latinhas pela metade e serviu o café ali, na latinha suja e grudenta. E como a gente estava num grupo grande, esperei que eles se servissem primeiro.
Eu nunca apreciei o sabor do café. Mas, intuitivamente, senti que deveria tomá-lo, e claro, não livre de sensações ruins. Afinal, o cara tirou as latinhas de refrigerante de dentro de uma lixeira, que tem sujeira, tem formiga, tem barata, tem de tudo. No momento em que empunhei a caneca improvisada, parece que todo mundo parou para assistir à cena, como se perguntasse:
'E aí, o jovem rico vai se sujeitar a beber nessa caneca?' E eu bebi.
Imediatamente a ansiedade parece que evaporou. Eles passaram a conversar comigo, a contar piada, brincar.
O que você sentiu na pele, trabalhando como gari?
Uma vez, um dos garis me convidou pra almoçar no bandejão central. 
Aí eu entrei no Instituto de Psicologia para pegar dinheiro, passei pelo andar térreo, subi escada, passei pelo segundo andar, passei na biblioteca, desci a escada, passei em frente ao centro acadêmico, passei em frente a lanchonete, tinha muita gente conhecida. Eu fiz todo esse trajeto e ninguém em absoluto me viu. 
Eu tive uma sensação muito ruim. O meu corpo tremia como se eu não o dominasse, uma angustia, e a tampa da cabeça era como se ardesse, como se eu tivesse sido sugado. Fui almoçar, não senti o gosto da comida e voltei para o trabalho atordoado.
 E depois de um mês trabalhando como gari? Isso mudou?
Fui me habituando a isso, assim como eles vão se habituando também a situações pouco saudáveis. Então, quando eu via um professor se aproximando - professor meu - até parava de varrer, porque ele ia passar por mim, podia trocar uma idéia, mas o pessoal passava como se tivesse passando por um poste, uma árvore, um orelhão.
E quando você volta para casa, para seu mundo real?
Eu choro. É muito triste, porque, a partir do instante em que você está inserido nessa condição psicossocial, não se esquece jamais. 
Acredito que essa experiência me deixou curado da minha doença burguesa. 
Esses homens hoje são meus amigos. Conheço a família deles, freqüento a casa deles nas periferias. Mudei. Nunca deixo de cumprimentar um trabalhador. 
Faço questão de o trabalhador saber que eu sei que ele existe. 
Eles são tratados pior do que um animal doméstico, que sempre é chamado pelo nome. São tratados como se fossem uma 'COISA'.
*Ser IGNORADO é uma das piores sensações que existem na vida!
Respeito: passe adiante!

Um comentário:

  1. E pensar que o mundo está mesmo rodeado de pessoas que se acham superiores a outras só por causa de um uniforme.
    Imaginem o mundo sem garis, lixeiros, catadores de lixo e vários outros. Seria um caos.

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